Em atenção à solicitação que lhe foi dirigida por Dom Geraldo Lyrio Rocha, Arcebispo de Mariana, a Congregação para a Causa dos Santos comunica que, depois da averiguação feita por parte da Santa Sé, não há nada que impeça, para que se inicie a Causa de Beatificação e Canonização de Dom Luciano Pedro Mendes de Almeida, da Companhia de Jesus, Arcebispo de Mariana, falecido em 27 de agosto de 2006. Com esta comunicação, a Arquidiocese de Mariana já poderá instituir o Tribunal que levará adiante esse tão esperado processo de beatificação e canonização do inesquecível Dom Luciano que recebe o título de Servo de Deus.
Dom Luciano: mestre do cuidado, ternura de Deus
Às vésperas da abertura oficial do seu processo de beatificação, que será no dia 27 de agosto de 2014, apraz pensar um pouco nas atitudes desse grande homem, que passou pelo mundo fazendo o bem, encantando as pessoas, testemunhando um amor que contagia e faz a diferença. E ainda, é um homem hodierno, dialogou com a nossa cultura, e soube ser diferente nela, mostrando Jesus a todos.
É um grande desafio escrever sobre os santos, haja vista que são pessoas que superam a lógica humana, superam os limites do pensável e encantam de tal maneira que criam uma forma de observação que silencia a voz e desperta o coração. Os santos simplesmente deixam as pessoas extasiadas e ‘engasgadas’ por tanto amor a Deus.
Somos devedores destes testemunhos de fé, graças a eles, somos pessoas crentes, filhos da Igreja e amparados pelo amor incondicional de Deus. São numerosos os santos, conhecidos e anônimos, e queremos aqui, com licença e reverência a todos os outros, escrever sobre um: Dom Luciano Mendes de Almeida (1930-2006).
Viveu com profundidade seu lema episcopal “In Nomine Iesus” (em nome de Jesus), como testemunham todos os que conviveram com ele. Viveu para fazer o bem, fez disso sua única razão de existir, não tinha tempo para si, pois se realizava trabalhando pelos outros e pelo Outro. Assumiu as palavras do Evangelho “é preciso que Ele cresça e eu diminua” (Jo, 3, 30).
Não pretendemos aqui, traçar a biografia deste homem, mas apenas recordar sua pessoa, nos seus grandes feitos. É uma existência inteira que aponta para Jesus, faz Dele sua razão de ser, e que o Cristo o encantou definitivamente a ponto de não se preocupar para onde seja conduzido no futuro.
O ser humano tinha um valor enorme para Dom Luciano, pois ele dizia que “deveríamos amar as pessoas na sua maior necessidade, na sua maior fraqueza”, tentar sempre, alguma forma, para que o outro seja feliz. Ele entendia o céu, como sendo uma realidade tão próxima, e, sobretudo, plena de possibilidade e que todos tinham condição de alcançá-lo. Certa vez ele disse que sonhou com o céu “De tanto sonhar com o céu, perguntei para Deus o que era o céu? Como era? Já que um dia eu iria morar lá, cheguei no céu, lá estavam todos felizes, cantando. Quando acordei, estava deitado debaixo de uma árvore, então entendi que o céu é ver os outros felizes”.
E, segundo esse critério, ele viveu mesmo no céu, trabalhou incansavelmente pelo bem dos outros e com eles. Caminhava junto, orientava, gastava suas noites de sono ouvindo as pessoas, doando dinheiro aos pobres, alimentado-os na sua própria residência, incansavelmente, mostrando que, de fato era Deus mesmo, quem o sustentava. Deus sustenta quem se dedica integralmente a Ele, e assim foi com Dom Luciano.
Ele orientava sempre ao amor, segundo ele “os gestos de amor gratuito não pesam, nascem da bondade do coração e alegram a pessoa que ama no mais profundo do seu ser. A felicidade está em dar (At 20,35), isto é, em experimentar a beleza de fazer o bem, de ajudar os outros, como fruto da bondade, a exemplo do próprio Deus. Ao lavar os pés, Jesus acrescenta: “sereis felizes se fizerdes assim” (Jo 13, 17). Para ser feliz assim, é preciso amar gratuitamente”.
Com efeito, o bem sempre foi sua norma de vida, aquecer o coração das pessoas era a sua
maior missão e isso ele soube fazer com maestria e com disponibilidade santa. Dom Luciano sempre se ocupou com os seres humanos e as suas causas. Sua vocação sempre foi marcada por uma profunda alteridade, não era visto num isolamento, nunca viveu sozinho, era sempre encontrado pelos pobres e com eles, e eles eram o seu maior tesouro.
Nas ruas de são Paulo, enquanto bispo auxiliar daquela importante arquidiocese, estava sempre com as crianças, onde fundou a pastoral do menor, e também com os moradores de rua, quando às vezes, eles é que estavam na casa de Dom Luciano para as refeições. Vale ressaltar o momento em que o Cardeal Arns foi avisá-lo do episcopado, ele respondeu com filial sinceridade “Dom Paulo, eu nasci apenas para ser pai e isso já sou”, mas aceitou o episcopado e daí em diante seu brilhantismo foi notório e notável.
Dom Luciano, na sua singular simplicidade, esgotou as possibilidades do possível, e tornou-se um referencial de fé. Foi mestre do cuidado, amava os seres humanos, a ponto de lutar por eles nas mais variadas instâncias, defendendo os indígenas e suas causas, lutando por uma Igreja pobre e para os pobres. Ele sabia, de fato, aquecer o coração das pessoas, e repetia sempre “a Bondade desarma”, e assim ele caminhava, dizendo sempre que Deus é Bom.
Sobre ele, escreveu com sabedoria Dom Walmor Oliveira de Azevedo “a mediocridade não reside, segundo uma lógica vigente, naqueles que administrativamente não são bem – sucedidos. Inaceitável é a mediocridade moral em razão da falta de sabedoria, amor e generosidade sem limites para o bem do outro, especialmente dos mais pobres e sofredores. O merecido título de servo bom e fiel, dado por Deus a Dom Luciano, seja lembrança e compromisso com sua grande convicção e prática, na herança imorredoura que a todos deixou: “a alegria de servir aos irmãos e irmãs é nossa maior recompensa”. Outra não seja a ousadia dos seus amigos e admiradores, no desejo de titular-se, seguindo seu exemplo, como servo bom e fiel”.
Foi um homem de constante oração, colocava sua situação diante de Deus e permitiu que Ele o conduzisse sempre, aceitando Suas decisões.
Cândido Mendes, irmão de Dom Luciano, comentou: “não há a falar tão só em testemunho “purificado” ou das catacumbas da Igreja no seu profetismo de agora, mas nessa Igreja mãe-mestra, do porte das diferenças entre um diálogo das civilizações em que toda a revalorização do ecumenismo encontra sua urgência. A filha, hoje, mais importante, entre as igrejas nacionais, a que hoje exprime a nossa CNBB, ganha um perfil maior que os relevos regionais nas vozes de sua peregrinação na história dos desmunidos de todo o mundo, a perfazer uma mesma expectativa e uma mesma esperança. No anonimato como na alegria, na humildade do que construa hoje o povo de Deus, fica a entrega radical de Dom Luciano, In Nomine Iesu.
Dom Luciano é a expressão viva da ternura de Deus, que ama o ser humano que se preocupa com ele. A presença de dom Luciano representa o abraço do Pai, sua afeição por suas criaturas. O Pai quer guardá-las e escolhe pessoas para trabalhar com Ele, o trecho do que mais chamava a atenção do bispo era aquela do Evangelho de são Mateus “Pois eu estava com fome, e me destes de comer; estava com sede, e me destes de beber; eu era forasteiro, e me acolhestes em sua casa; estava nu, e me vestistes; doente, e cuidastes de mim; na prisão, e fostes visitar-me” (Mt 25, 36-37).
Ele fez dessa passagem a sua vida no seu sentido mais radical. Ele foi ternura de Deus e por isso mestre do cuidado. Soube conjugar o ser pai, bispo, amigo, pois antes de tudo, amava. Ele encantou, pois era um homem que não falava do amor, simplesmente amava.
Alessandro Tavares Alves
II ano de Teologia – Diocese de Leopoldina