Nos dias 17 e 18 de outubro, no Centro Pastoral Dom Reis, em Leopoldina, o clero de nossa Diocese esteve reunido para mais um encontro de atualização. Desta vez o tema abordado foi “Espiritualidade e Afetividade” e teve como assessor o teólogo Alfonso García Rubio. Marcado por muita descontração e alegria, o encontro levou os padres a uma profunda reflexão sobre a vivência da afetividade no exercício de sua missão.
O assessor partilhou sua longa caminhada de vivência presbiteral e as ambiguidades que marcam nossa existência humana. Partindo da urgente necessidade de mudança em nossa linguagem que pouco ou nada comunica, Garcia Rubio, percorrendo reflexões do Papa Francisco na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, ressaltou nossa dificuldade em usar uma linguagem que comunique no mundo de hoje a Boa Nova do Reino e não falsifique a imagem de Deus e do ser humano.
Abordou cinco importantes temas que nos auxiliam numa sadia relação entre espiritualidade cristã e afetividade:
- Necessidade de superar uma antropologia dualista e desenvolver uma visão integrada da pessoa humana. Diante da complexidade da existência humana, muitas vezes cedemos às tentações de um reducionismo dualista e colocamos dimensões importantes de nossa existência em contraposição e não conseguimos fazer a necessária integração que nos levaria a uma existência mais harmoniosa com o projeto de Deus, tais como: oração e compromisso social; sagrado e profano; ministério ordenado e sacerdócio comum; encontro com Deus e encontro com as pessoas. Uma experiência humano-cristã amadurecida consegue um equilíbrio entre as várias dimensões do nosso existir.
- Porque somos pessoas, somos chamados a desenvolver uma subjetividade aberta. Há um duplo movimento necessário para a maturidade humana: o autopossuir, isto é, a capacidade de ser livre e sujeito de escolhas; e a relação com o mundo, como os outros e com Deus. Nessa dinâmica o ser humano pode se firmar numa subjetividade fechada onde viva as relações com os outros seres numa atitude meramente funcional, que nega a outra pessoa e a busca apenas enquanto corresponda às suas expectativas; ou então, num desenvolvimento sadio, firmar-se numa subjetividade aberta, que respeita e acolhe o outro em sua originalidade. Nesta forma de relacionar-se, Deus é respeitado e valorizado como Deus e, consequentemente, se aceita as interpelações e compromissos que o dom do amor de Deus implicam. Utiliza-se responsavelmente os recursos naturais, num espírito de contemplação e gratuidade e, principalmente, uma abertura-acolhimento do outro como outro, assim como Jesus de Nazaré o fez.
- Subjetividade aberta e maturidade afetiva: o processo de amadurecimento da afetividade humana. O dinamismo básico da vida humana o leva a relacionar-se com o mundo que o cerca. Tal relacionamento se dá nos níveis biológico, psíquico e espiritual. Desde nosso nascimento vamos desenvolvendo esse dinamismo, podendo encontrar um caminho de maturidade ou de bloqueios, onde não se desenvolva a independência e autonomia, gerando infantilidade em todos os campos. Tal infantilidade tem ampla manifestação na vida espiritual, influenciando na concepção de Deus e, consequentemente, na prática da vida religiosa. Podemos identificar que houve um amadurecimento humano-afetivo, com a vivencia sadia das etapas psicoafetivas, quando desenvolve-se uma relação com Deus firmada na prática da justiça e no amor efetivo, no cotidiano da vida.
- Para conseguirmos um amadurecimento de nossa vivência afetiva, precisamos dar alguns passos: tomarmos mais consciência de nossas possibilidade e qualidades e não ficarmos presos às nossas falhas, pacificando-nos interiormente; ajudar o outro a reconhecer e desenvolver suas qualidades e dons; expressar sentimentos sinceros de aprovação, estima e louvor; saber receber e integrar sentimentos sinceros de aprovação manifestados pelos outros; cultivar “o tempo e espaço simbólicos”.
- A realidade humana é marcada por ambiguidades. É preciso saber vive de maneira integrada, consciente de que todo ser humano possui uma orientação salvífica para a vivência no amor e uma tendência para o fechamento em si, para a dominação. O encontro com Jesus Cristo é profundamente libertador, mas não elimina nossas ambiguidades. Joio e trigo coexistem. É preciso desenvolver uma sábia economia energética pautada pelo humor. Os grandes perigos, no entanto que podem nos impedir de uma vivência equilibrada, é a mentira e a tentação do perfeccionismo.
Animados pelas reflexões os padres puderam nestes dias viver intensamente a Fraternidade Presbiteral, com partilhas de vidas e expectativas. Talvez esteja aí, o principal ganho desses encontros de formação presbiteral.
Ao nosso irmão sábio e bem humorado, Alfonso García Rubio, nossa gratidão e louvor!
Frei Gilberto Teixeira da Silveira